Sentado a um canto do seu quintal aproveitava a sombra da
casa vizinha que por ali se fazia passear naquelas horas de mais calor, ouviu
as dobradiças do velho portão, um já conhecido gritinho que o faziam preparar
para receber as visitas. Os leves passinhos em timbre de corrida rapidamente fizeram-no
perceber quem lá vinha, e ao dobrar o canto da casa com uma alegria contagiante
- Vamos ver o mar, avô
num quase cântico entre pulos, de inocente sorriso motivados
pela anunciada viagem o menino voou para os braços do velho que, de um também
enorme sorriso por entre as rugas, prontamente aceitou o convite. Não tinha
como negar, apesar da sua cada vez mais vagarosa vida, perder a oportunidade de
abdicar da sua calma e sossego pelo neto era o que
mais lhe agradava. E desta vez iriam ver o mar.
O menino perdia-se pelas dunas douradas, corria e assustava
gaivotas, sorria e brincava, fugia das ondas e esbanjava toda a sua satisfação
pelo areal.
Mas perto de onde o mar vai e vem e onde deixa a sedosa
areia molhada encontrava-se o velho imóvel, capturava o máximo de sensações que
aquele momento lhe concedia. O sol no seu enrugado rosto que de sombras já não
queria saber; o vento que fazia ondular os finos cabelos grisalhos como as hipnotizantes
ondas que os seus agora brilhantes olhos contemplavam; o cheiro do mar que lhe
apagava da memória as terríveis doenças de inverno; a sensação sem igual que sentia
por todo o corpo, provocada a cada onda que acabava nos seus pés; queria guardar
em si tudo, não esquecer, não perder nada.
O menino dormia na sombra do colorido chapéu-de-sol enquanto
o velho ainda se mantinha no mesmo local. Não teve necessidade de correr ou
saltar, decidiu aproveitar o mar assim, sereno e calmo como a sua vida o
habituou a estar, porque aquele dia de novidades poderia não voltar a
repetir-se.
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